15 fevereiro 2018

O princípio de Montesquieu

Este artigo do advogado e político Aguiar Branco pareceu-me premonitório. Ele deve estar a antecipar o mesmo que eu.

E o que é que ambos estaremos a antecipar?

Que, em breve, os advogados, e sobretudo as sociedades de advogados conotadas com partidos políticos (como é o seu caso) estarão no centro das atenções da opinião pública.

E não se vão sair bem.

Em síntese, Aguiar Branco defende e orgulha-se da promiscuidade entre a profissão de advogado e a condição de político partidário.

Eu não me orgulho nada e qualquer cidadão que pense um pouco, e preze a democracia, também não se vai orgulhar. É que as sociedades de advogados e os advogados conotados com partidos políticos são um dos maiores cancros da vida pública portuguesa porque desacreditam a justiça e a própria política, para além de se desacreditarem a si próprios.

Na tradição de Montesquieu, os três poderes de uma sociedade democrática - legislativo, executivo e judicial - devem ser separados e independentes.

Ora, existe apenas uma profissão no mundo - seguramente no mundo português - que penetra os três poderes do Estado ao mesmo tempo, e essa é a profissão de advogado.

Um engenheiro pode ser ministro ou deputado, mas nunca penetrará no sistema de justiça. O mesmo é verdade para um contabilista, um médico, um psicólogo ou um economista. Ao invés, um juiz nunca será  ministro ou deputado e, por isso, nunca penetrará na política

A profissão de advogado é a única que, ao mesmo tempo, está presente nos três poderes do Estado - legislativo, executivo, judicial. É ela que corrompe o princípio de Montesquieu relativo à separação de poderes. Não há outra.

Sendo parte do sistema de justiça, só a profissão de advogado pode contaminar o sistema de justiça com a política partidária. E é isso que ela faz através dos advogados e sociedade de advogados conotados com a política.

São estes advogados - a que noutro momento chamei advogados-politiqueiros -, a cuja classe pertence Aguiar Branco, que corrompem a justiça, politizando-a,  - e que, de volta à política, corrompem a política, judicializando-a.

Politização da justiça e judicialização da política - como estamos a assistir no Brasil, em Espanha e em Portugal, para já não falar na Itália - são a receita certa para acabar com a democracia. Não para a promover, como pretende o advogado Aguiar Branco. Mas acabar com ela, desacreditando-a radicalmente aos olhos dos cidadãos.

Para não terminar sem um exemplo, volto ao meu case-study que, por ser simples, torna o exemplo claro acerca, por um lado, de como esta classe de advogados politiza a justiça e, por outro, como ela judicializa a política.

Duas sociedade de advogados estão do lado da acusação - uma, dirigida por Paulo Rangel, vice-Presidente do PSD, outra por Miguel Veiga (entretanto falecido), um conhecido barão do PSD. Estão identificadas com o mesmo partido e com a mesma facção desse partido.

Estão ali a fazer justiça ou a fazer política?

É esta questão - que permite todas as especulações -, que desacredita a justiça. A justiça fica politizada.

Tratemos agora da judicialização da política. Tudo começou com um comentário do réu sobre uma obra mecenática que estava a realizar e que competia aos políticos fazer (mas não fizeram). Portanto, o assunto tem uma inegável componente política. O acusado convidou o ofendido a ir lá defender-se ao estúdio da TV. Mas ele não apareceu. Em lugar disso, respondeu levando o assunto para o tribunal. É a judicialização da política.

A politização da justiça e a judicialização da política.

Os autores?

Os advogados e sociedades de advogados conotados com a política - os advogados-politiqueiros.

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